Laura

Laura, a linda moça a quem este website é dedicado, uma jovem inteligente e sensível, foi durante sua vida um espírito de muita luz e alegria na vida de muitos que com ela conviveram.  

Cresceu ajustada e feliz, era uma criança pacificadora e gentil, que fazia amigos com muita facilidade. Extrovertida e alegre, com um círculo social numeroso, tinha um grande grupo de amigas muito próximas. 

Aos 21 anos, ela estudava Direito, fazia trabalho voluntário ajudando pessoas carentes com problemas na justiça e já iniciara um estágio remunerado, atuando com muito interesse na profissão que escolhera. Mas, a vida profissional que estava florescendo, foi interrompida, quando teve uma forte crise de dor na coluna lombar. A dor era tão forte que foi hospitalizada para fazer exames. O diagnóstico dado foi espondilolistese na vértebra L5, um problema congênito.

As dores se tornaram constantes e ela não conseguia mais trabalhar ou ir à faculdade. Estava muito incomodada com essas limitações e procurou uma terapia. Apesar de não ter sintomas de doença mental recebeu prescrição do antidepressivo Pamelor. Algum tempo depois, tomou vários comprimidos e foi levada à emergência. Inquirida sobre o que a levara a fazer o que fez, disse que se sentia muito triste e pensou que aumentando a dose do remédio, ficaria melhor. A médica nos alertou, só após o evento que os antidepressivos, se tomados em dose muito alta, podem ser fatais. Assim mesmo achou melhor que ela continuasse, sem alertar sobre os outros riscos do medicamento. 

Laura continuou na terapia mas, após um tempo, resolveu parar. Sem saber que corria sérios riscos interrompendo bruscamente, ela descontinuou a medicação. O efeito citado consta na própria bula de Pamelor, como pode ser visto na transcrição abaixo: 

O QUE DEVO SABER ANTES DE USAR ESTE MEDICAMENTO?   Advertências  -  Piora clínica e risco de suicídio   

Pacientes com distúrbio depressivo principal, adulto e pediátrico, podem experimentar piora da sua depressão e/ou o surgimento do pensamento e comportamento suicida ou mudanças incomuns de comportamento, se eles estiverem tomando ou não medicamentos antidepressivos, e este risco pode persistir até que ocorra remissão significante. Existe uma preocupação de longa data de que os antidepressivos possam induzir a piora da depressão e o surgimento do comportamento suicida em determinados pacientes. Os antidepressivos aumentaram o risco do pensamento e comportamento suicida em estudos de curta duração em crianças e adolescentes com Distúrbio Depressivo Principal (DDP) e outros distúrbios psiquiátricos.

Como as dores continuavam, o ortopedista concluiu que a dor não estava adequada ao problema e pediu à Laura consultasse um psiquiatra. Essa movimentação de uma vértebra provoca muita dor e Laura sentiu que ele duvida dela, mesmo assim aceitou ir, na esperança de voltar a ter uma vida normal.

Laura consultou o psiquiatra indicado. Quando ele soube que ela havia usado um antidepressivo. afirmou que teria havido um erro de diagnóstico e por isso o remédio não havia dado resultado. Segundo o médico ela não tinha depressão e sim transtorno bipolar. Novamente, o diagnóstico foi dado sem exame físico algum e foi dito que o antidepressivo deveria ser associado a outras medicações. Assim, além do antidepressivo, ele receitou anticonvulsivante, antipsicótico e Ritalina. Laura se queixava dos efeitos dos remédios e esses foram trocados várias vezes. O médico dizia que essa seria a forma para achar a combinação de drogas que fosse melhor para ela.

Embora até nos parecesse absurdo que uma pessoa sem sintomas de doença mental recebesse esse diagnóstico e a prescrição de psicotrópicos, essa foi a única opção dada a ela e confiamos no médico. Essa opção, no entanto, se revelou claramente equivocada, pois logo após, quando Laura teve uma convulsão, o psiquiatra admitiu que fora causada pela medicação. Infelizmente, na época, não sabíamos que os tratamentos psiquiátricos com medicamentos são decididos pelo método de tentativa e erro e não há estudo algum comprovando a segurança de usar várias medicações concomitantemente. 

Laura continuou numa espiral descendente. Após a convulsão, o médico achou melhor interná-la e ela ficou incomunicável numa clínica. Apos voltar para casa, iniciou-se um período que parecia ser um filme de terror. Ela começou a ter ataques de pânico e a se auto-mutilar, tinha surtos psicóticos e quando se feria, não sabia dizer como acontecera. Depois dizia não lembrar de nada. Sempre afirmava que não queria morrer, que adorava a vida.  

Nos 2 anos de terapia ela recebeu uma variedade de prescrições de drogas, que provavelmente foram a causa de todos esses problemas e sintomas. Ela nunca tivera esses comportamentos antes de iniciar o uso de drogas psiquiátricas. Os efeitos adversos foram se intensificando e ela foi perdendo o contato consigo mesma. Não sentia mais alegria, falava sempre que, “a vida ficara cinza, em preto e branco” ou “que queria a vida dela de volta”. Ignorando que ataques de pânico, automutilação e outras condições pudessem ser efeitos colaterais das drogas, e estes estão todos relacionados nas bulas das mesmas, não sabíamos o que estava acontecendo. Também não tínhamos conhecimento que as pessoas diagnosticadas com transtorno bipolar são as que mais cometem suicídio.

Foi pedido ao psiquiatra que Laura não tivesse acesso livre à medicação. Além das drogas para o transtorno, ele também receitava tranquilizantes. Ao ser perguntado se não seria arriscado ela ter acesso livre a essas drogas, ele respondeu que ela era adulta e podia cuidar da própria medicação. Na posição de mãe, achava que ela deveria procurar outro médico. Minha intuição me dizia que havia algo muito errado, ela não melhorava. Ao contrário, e apesar da maior queixa ser a dor, alguma coisa a bloqueava a buscar a cura. Infelizmente não aceitou, assim como não aceitou fazer uma cirurgia para resolver o problema. 

Os pais não tem acesso ao que acontece nos consultórios psiquiátricos, quando os filhos já são adultos. A dependência do paciente ao médico pode se tornar muito grande. As drogas, que devem ser usadas somente em casos extremos, se usadas a longo prazo são prejudiciais. Induzem a pessoa a se considerar como doente, alguém que não tem responsabilidade sobre si mesma e necessita de remédios para seguir adiante.

Em 2005, a internet não tinha a abrangência que tem hoje, era bem menos comum questionar as opiniões médicas, além disso os efeitos adversos das drogas para doenças mentais eram pouco conhecidos, mesmo estando descritos nas bulas. Infelizmente, desconhecer que drogas psicotrópicas podem induzir o comportamento suicida, custou uma preciosa vida, a de Laura, minha filha. 

Em seus últimos dias de vida, Laura estava bastante confusa e, certo dia, tomou vários comprimidos de Rivotril. Isso aconteceu num fim de semana e o psiquiatra dela estava de férias. Apesar de estar a apenas 120 km de distância, ele se recusou a vir atendê-la. O médico, que foi o responsável por prescrever os remédios, não se dignou a vir para que ela fosse admitida no hospital. Ele apenas falou secamente,“não irei e estou largando o caso!” 

Laura ficou uma semana no hospital, estava agressiva e perturbada, eram os sintomas de abstinência. Haviam substituído bruscamente todas as medicações que ela usava, por novas. Quando ela foi para casa, passou a ter auxiliares de enfermagem cuidando-a e nunca a deixávamos sozinha. Ela parecia tranquila, aceitando que precisava ficar mais isolada.

Um dia antes da morte dela, foi a uma consulta com o psiquiatra que assumiu o caso dela no hospital. Ele nos afirmou que havia feito vários exames neurológicos e concluiu que Laura não tinha transtorno bipolar, apenas uma “depressão muito leve”, assim a liberou  da vigilância de suicídio. Não sabíamos que o período mais perigoso para o paciente cometer suicídio é o início, a parada e a troca de medicações psiquiátricas.

Um médico que prescreve essas drogas deveria saber, no mínimo, que é perigoso retirar de súbito todos os medicamentos e substitui-los. Mais ainda, não temer retirar da vigilância de suicídio cedo demais. Assim, na primeira oportunidade, sem aviso ou despedida, ela partiu…

Infelizmente, as primeiras advertências sobre os antidepressivos causarem pensamentos suicidas demoraram a ser divulgadas e ainda não são muito conhecidas. A maioria das drogas receitadas para Laura foram listadas pelo FDA (agência reguladora de medicamentos dos EUA) como passiveis de causar pensamentos suicidas em adolescentes
 e adultos jovens, já em 2004. Isso pode ser visto nessa matéria sobre o assunto no site Mad in Brasil – Alerta de suicídio no rótulo de antidepressivos é justificado, dizem pesquisadores.

Se Laura não tivesse feito uso de drogas psiquiátricas, muito provavelmente estaria viva. Os primeiros sintomas apareceram assim que ela iniciou um antidepressivo. Quando outras drogas foram adicionadas, os efeitos adversos foram crescendo e culminaram com o suicídio, certamente induzido por drogas prescritas.

As lágrimas ainda escorrem no meu rosto a medida que escrevo. Como pode ter dado tudo tão errado? Porque nem a família, os médicos ou alguém percebeu o que Laura estava passando? Como ela jamais manifestou desejo de tirar a vida? 

Aprendi muita coisa após, tarde demais para ela, mas espero que lendo a história dela muitas pessoas possam ser poupadas desse sofrimento. Aprendi que precisamos tomar nossa saúde em nossas mãos, que é necessário ouvir diversas opiniões e pedir a nossos médicos tratamentos sem drogas. Aprendi que não se pode aceitar um diagnóstico subjetivo, seguido pela prescrição de drogas, sem embasamento científico algum. Aprendi que antes de aceitar tomar/injetar qualquer medicamento é necessário pesquisar seus efeitos adversos cuidadosamente. Um medicamento nunca deve ter efeitos piores do que os que o paciente já está sentindo. Aprendi que devemos orar e ouvir nossa voz interior, nossa intuição, e pedir a Deus que nos permita fazer as melhores escolhas, principalmente aquelas que não irão prejudicar a nós, a nossos filhos e a todas as pessoas com as quais temos voz de decisão. 

Lia Beatriz Fleck

Compartilhe

Delírio da Depressão é uma plataforma de informações on-line, que apresenta o livro que dá nome ao site, além de informações e opiniões de profissionais de saúde reconhecidos internacionalmente, levando ao público em geral maiores conhecimentos sobre a depressão. Toda e qualquer informação, material e conteúdo publicado aqui é fornecido apenas para fins educacionais e informativos. O conteúdo aqui publicado não constitui nem deve ser interpretado como conselho profissional de médico, clínico, farmacêutico, terapeuta, conselheiro, prescritor de medicação psiquiátrica ou qualquer outro tipo de profissional licenciado e não deve ser usado para tratar ou diagnosticar quaisquer doenças, ou sintomas.

Categorias